segunda-feira, 27 de maio de 2013

A Dinâmica Recente do Capitalismo

Parafraseando Hegel, mas também a nossa sabedoria popular, «o que tem que ser, tem muita força»... Lénine dizia algo de semelhante quando dizia algo como «os factos são muito teimosos».
E os factos aí estão...


Dinâmica Recente do Capitalismo
Em 20 frases simples
(e numa perspectiva de poucas décadas)


01. O próprio do capitalismo é crescer e acumular, acumular e crescer.
02. A "cenoura" – motivação – e motor da actividade é a busca de lucro.
03. A taxa de lucro funciona como «acelerador», «travão» e ainda como «caixa de velocidades». Acontece que a taxa de lucro tem períodos de subida, de estagnação e de descida
04. Entretanto o montante dos lucros empresariais repartem-se em: rendas (pagamento aos «senhorios»), juros (pagamento aos «donos do dinheiro») e impostos (pagamento pelos serviços básicos do Estado minimalista).
05. Quando a taxa de lucro começa a descer verifica-se uma busca desenfreada por «saídas» (ou «aplicações»...) para o excedente potencial, com a sua conversão em excedentes financeiros.
06. Assim sendo, quando a TAXA de lucro começa a descer, para manter incólume a MASSA (o montante) dos lucros, o Capital procurará reduzir as transferências para os «senhorios», para os «bancos» e para o Estado… 
07. Como os donos do Capital se combinam/misturam facilmente com os «senhorios» e com os «donos do dinheiro», os «custos» dessa redução sobram naturalmente para a Res Pública.
Daí veio a resultar:
08. Uma exigência de redução nas taxas dos impostos tipo IRC e de IRS aplicáveis aos donos e agentes do Capital.
09. Para facilitar a optimização fiscal, um manipulação e ajuste das normas e padrões de contabilidade.
10. Ainda para facilitar a optimização fiscal, uma exigência da flexibilização dos padrões e enquadramento legal da auditoria.
11. Veio também a liberalização dos movimentos de capitais financeiros o «Bigger Bang» e os «Euromarkets» consagrando o dinheiro virtual sem qualquer controle estatal/nacional.
12. Entretanto... Dos ganhos de produtividade veio a resultar uma «compressão dos salários» e o «desemprego sistémico»... Logo, redução do poder de compra global ou a nível sistémico...
13. Se o sistema reduz o poder de compra agregado, há que facilitar o acesso ao CRÉDITO (como fonte de receita para os bancos).

14. Temos assim uma dupla BIFURCAÇÃO nas Taxas de Juro
Entidades
Bancos Comerciais
Bancos Centrais
Destino
Consumo
Investimento
Efeito
Aumento = Usura
Redução = Quantitative Easing
15. Tivemos assim e também a abolição das Leis da Usura (ou seja, a permissão de taxas de juro sem limitações...)
 16. Daí veio a resultar um aumento exponencial do consumo a crédito e naturalmente o aumento da dívida privada.
17. Da redução das taxas daqueles impostos e da «optimização» fiscal veio a resultar o aumento do défice público, forçando os Estados a «vampirizar» as respectivas Seguranças Sociais.


18. Temos entretanto a inoperância da redução das taxas de juro para o investimento reprodutivo de bens e serviços, pois que «com uma corda não se empurra uma carroça»
19. Na falta de outras «aplicações» e/ou «fontes de rendimento», a «Banca» (em especial na zona Euro...) aproveita para «financiar» a dívida pública...
20. De tudo isto só pode resultar uma propensão para a instabilidade social, o caos e, eventualmente, a guerra...
Dá para perceber, ou é preciso fazer uma diagrama?...

sexta-feira, 24 de maio de 2013

Coisas de longe...

ALGUMAS REFLEXÕES AVULSAS SOBRE DÍVIDA E METÁFORAS

Ainda longe deste «jardim da Europa à beira mar plantado» recebi, de um amigo de longa data, este texto delicioso que parece que volta a circular pela Rede.

«Curso rápido de Economia...
Um viajante chega a um hotel para dormir, mas pede para ver o quarto. Entretanto, entrega ao recepcionista duas notas de 100 euros.
Enquanto o viajante inspecciona os quartos, o gerente do hotel sai a correr com as duas notas de 100€, e vai à mercearia ao lado pagar uma dívida antiga... 
Exactamente de 200 euros. 
Surpreendido pelo pagamento inesperado da dívida, o merceeiro aproveita para pagar a um fornecedor uma dívida que tinha há muito... também de 200 euros.
O fornecedor, por sua vez, pega também nas duas notas e corre à farmácia, para liquidar uma dívida que aí tinha de... 200 euros.
O farmacêutico, com as duas notas na mão, corre disparado e vai a uma casa de alterne ali ao lado, liquidar uma dívida com uma prostituta.... 
Coincidentemente, a dívida era de 200 euros.
A prostituta agradecida, sai com o dinheiro em direcção ao hotel, lugar onde habitualmente levava os seus clientes e que ultimamente não havia pago pelas acomodações. 
Valor total da dívida: 200 euros.
Ela avisa o gerente que está a pagar a conta e coloca as notas em cima do balcão.
Nesse preciso momento, o viajante retorna do quarto, diz não ser o que esperava, pega nas duas notas de volta, agradece e sai do hotel.
Ninguém ganhou ou gastou um cêntimo, porém agora toda a cidade vive sem dívidas, com o crédito restaurado e começa a ver o futuro com confiança!
MORAL DA HISTÓRIA:
NINGUÉM ENTENDE A ECONOMIA! (nem o gajo que escreveu isto!)
E MUITO MENOS EU. MAS FICOU TUDO SALDADO E SEM RECURSO AOS TRIBUNAIS!!! SAFA!!!»
A história está com alguma piada e até tem a sua verosimilhança...

Faltaria apenas acrescentar o pequeno, mas nada insignificante, detalhe da ausência de um banqueiro ou agiota naquela historieta. Tudo ali se passava na base da confiança recíproca entre todos os participantes.

Se juntarmos à história a presença (existência) de um banqueiro ou agiota (esta coisa de eu escrever «banqueiro OU agiota» nem é inocente nem é uma questão de estilo literário...) e pensando na Dívida pública do «nosso» Estado, poderíamos chegar à conclusão  – na nossa vida real da alegadamente nossa «Dívida» objectiva e concreta de 127% do «nosso» PIBde que uma saída para esta crise da dívida será (há-de vir a ser...) a nacionalização da Banca. 
O resto serão detalhes para «contabilistas» armados em políticos.

segunda-feira, 13 de maio de 2013

Afinal ainda mais um esclarecimento

A situação inicial
Na janela proposta aqui para que se façam «experiências» sobre a possível evolução da taxa de lucro - variável determinante do comportamento de todos os agentes económicos e do sistema como um todo -
Trata-se, naturalmente, de uma situação hipotética que pretende representar um «capitalismo abstracto subjacente ao capitalismo real» de fins do século XVIII. Nisso sigo o autor Ronald Meek (Economics and Ideology and Other Essays, 1967).
Temos então que o capital total à disposição do «capitalista colectivo» aparece aqui como sendo constituído por 12.000 «unidades». 
Estas 12.000 «unidades», tanto podem ser expressas sob a forma de «o resultado acumulado de uns tantos milhares de horas de trabalho» como «X toneladas de "alimentos" mais Y «unidades de ferramentas».
A relação aqui assumida - nesta hipotética situação inicial - é a de 1 (uma) unidade de «capital-máquina» (ou capital constante) para 5 (cinco) unidades de capital-pessoas (ou capital variável).
Presume-se também que o colectivo das pessoas trabalhadoras, trabalhando 10 horas por dia, produz o suficiente para que esse «colectivo» se mantenha vivo e activo, assim como o suficiente para a sua reprodução geracional, e  ainda mais «alguma coisa» que reverte para os «capitalista colectivo» (ou «factor capital»).
É a esse excedente (que reverte para o «capitalista colectivo») a dividir pela totalidade (as tais 12.000 «unidades») inicialmente «investida» que se chama aqui «taxa de lucro sistémico».
O qual «lucro sistémico» é depois disfarçado, camuflado e recoberto de mil roupagens e maquilhagens de cosméticas pseudo-financeiras, ao ponto de se travestirem prejuízos sistémicos em lucros bolsistas.  
Houve um dia em que um meu amigo (professor universitário de matemática) depois de «olhar para isto» fez «quase de imediato» a observação (ou algo assim...) de que «a solução para o sistema funcionar equilibradamente, era reduzir os tempos de trabalho»
Agora procurem lá explicar isto aos «economistas» CONVENCIONAIS que nos desgovernam. Ou então, procurem explicar o significado da expressão: «actuar na conjuntura tendo em conta a estrutura do sistema»
E depois disto, começo a pensar que é mais fácil explicar as minudências da mecânica quântica, o «entrelaçamento das partículas subatómicas» ou a experiência da suposta «dualidade partícula-onda», do que explicar estas coisas da economia política. 
Se calhar o Lénine é que tinha razão: para perceber isto tudo, se calhar, primeiro é preciso estudar a «Ciência da Lógica» de Hegel...

sábado, 11 de maio de 2013

A PROPÓSITO DE ALGUNS COMENTÁRIOS – 5

Para concluir os esclarecimentos...
Com base nas indicações feitas nas mensagens anteriores espera-se que os observadores deste blogue – quaisquer outros visitantes – sintam interesse em «brincar» com o (MUITO) rudimentar modelo aqui proposto.
Reproduzo aqui, de novo, o gráfico inicial – que é o resultado de uma «simulação» efectuada. Podem experimentar outros números, mas atenção que uma casa centesimal (estamos a falar de efeitos ao longo de muitas décadas) pode fazer toda a diferença.
Assim, nesta simulação, considerei que haveria (teria havido...) ao longo dos dois últimos séculos uma taxa média de refluxo de 1,5% (ano, após ano...); um impacto (ou crescimento) médio de 2,8% na produtividade agregada e uma taxa de destruição de valor («ocasional»... as guerras...) de 25%.
No gráfico aqui exibido pode ver-se a situação subjacente à ocorrência de graves crises sistémicas em intervalos variáveis, mas também com alguma regularidade. Um historiador poderá pensar aqui em anos de referência como «1840«, «1875», «1929» ou «1975»...
Ou então lembrar a famosa «Onda de Kondratieff».
Tanto quanto eu saiba, o único economista que considerou a hipótese de a oscilação da taxa de lucro estar subjacente à «Onda de Kondratieff» foi Ernest Mandel. De resto não encontrei mais qualquer referência na literatura consultada.
Claro que faltaria MUITO para melhorar este modelo.
Mas com os meios disponíveis (e a carolice de um voluntário em «part-time» esporádico) é o que se pôde arranjar. Nesse contexto não posso deixar de registar o meu agradecimento ao meu amigo e ex-colega de estudo António Figueras,  (doutorando em Ciências da Complexidade), pela disponibilidade e trabalho efectuado na programação do modelo aqui apresentado.

Coisas mais que se possam via a fazer...
Desde logo, afinar os critérios que levam o sistema programado a despoletar um subprocesso societal de «destruição de valor»...
Um outro aspecto a considerar seria a hipótese de programar como simular os «mecanismos de atenuação ou "fuga do abismo" da queda da taxa de lucro». De facto, no mundo real do muito complexo entrelaçamento entre a Economia e as Finanças, tem havido muitas técnicas para obviar aos efeitos imediatos – no rendimento dos «donos do Capital», de modo a «adiar o mais possível o inevitável».
Por outro lado, adoptar antes a abordagem da modelação com base em agentes ("Agents Based Modelling") em que os diversos agentes heterogéneos, tivessem apenas em comum a «função de utilidade» (maximização do seu benefício pessoal) sujeita (ou constrangida) a esta lógica aqui programada.
Mas haverá mais coisas que outros poderão sugerir, depois de entenderem as idéias que lhe estão aqui subjacentes.
Para concluir, uma coisa que ainda me vai surpreendendo (?...) é o facto de não ter ainda surgido um candidato a doutoramento em Ciências da Complexidade que se queira meter a elaborar uma Tese sobre esta temática.
Já houve prémios «Nobel» em  Economia por «avanços» muito menos significativos na compreensão dos fenómenos económicos
Mas, seja como for, ou por outro lado, está-me a chegar a fase da «cana de pesca». Estou disponível para comprar uma e começar a sentar-me nas rochas junto à praia, aqui a uns 500 metros de casa...
Não haverá por aí ninguém que queira vender uma cana de pesca usada? 

sexta-feira, 10 de maio de 2013

A PROPÓSITO DE ALGUNS COMENTÁRIOS – 4

Quase a acabar (estes esclarecimentos...)

Considera-se que – em última análise – a totalidade da sociedade humana se pode «resumir» a dois grandes grupos de agentes económicos. Estou a falar de «modelos representativos», «arquétipos» ou «entidades abstractas» que no entanto se corporizam em pessoas e instituições concretas.
A sociedade humana como um todo, na sua interacção com a Natureza, dispõe de dois tipos de instrumentos, meios ou «ferramentas». Por um lado será o «capital acumulado» (sob a forma de máquinas, tecnologia – ou saber acumulado - estruturas fabris diversas e outras obras de engenharia vindas do passado); por outro lado será o «capital vivo», a capacidade que os seres humanos vivos têm de trabalhar e produzir o que quer que seja.
No modelo que aqui se procura explanar, ao capital acumulado chamamos de «capital constante» (ou «constant capital») e ao capital vivo chamamos de «capital variável» («variable capital»).
Em cada ciclo de produção (anual, por exemplo...) todos e cada um dos membros «adultos» da sociedade humana está em permanente processo criativo. Daí resultam (têm resultado...) permanentes melhoramentos sobre as «formas de trabalhar» nos mais diversos tipos de actividade. São os ganhos de produtividade.
No modelo que aqui se procura explanar, na sequência de cada ciclo de produção (de tudo e mais alguma coisa) considera-se que alguma parte do excedente produzido reflui (regressa ou retorna) para o sistema sob a forma de «investimento» e que nesse investimento há ganhos de produtividade.
A esses ganhos de produtividade chama-se aqui «impacto sobre o "capital constante"» e «impacto sobre o "capital variável"».
Presume-se que cada agente representante do "capital variável" dispondo embora de 24 horas por dia, dedica no entanto «apenas» 10 horas por dia a actividades de «transformação» da Natureza ("virgem" ou "já parcialmente transformada").
Em rigor, a lógica do sistema acaba por ser a mesma, quer se trate de 10 horas por dia quer se trate de 5 ou 6 horas de trabalho por dia...
Um outro aspecto a considerar será a relação entre «trabalho necessário»«reprodução social») e «trabalho excedente» (aquele que PODE reverter para o processo de acumulação).
São estas as variáveis fundamentais da «camada geológica» (pouco ou nada visível) do sistema económico. A lógica daquilo que se passa a esse nível é determinante e condiciona tudo o mais que se possa passar nas «camadas superiores» (o subsistema dos preços, as instituições, as finanças, a governação...) do sistema económico global.
Num próximo e ultimo esclarecimento (para já...) espero indicar como tudo «isto» tem a ver - ou está implícito - no modelo aqui desenvolvido.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

A PROPÓSITO DE ALGUNS COMENTÁRIOS – 3

Continuação...
Nas sociedades que hoje consideramos «antigas» ou «primitivas» o processo de «acumulação» era naturalmente elaborado pelas colectividades como um todo, cada uma sob a direcção de um «chefe», fosse ele um «rei», um «imperador» ou outra coisa qualquer.
Para efeitos desta explanação, digamos que a partir de certa altura – e de modo diferenciado em cada sociedade humana – o processo de acumulação passou a beneficiar uns grupos em detrimento de outros. Ou então beneficiando mais uns grupos sociais do que beneficiava outros grupos dentro da mesma sociedade. Podemos também assumir (ou supor) que alguns grupos sociais dentro de algumas sociedades conseguiam impor, a outras sociedades «estrangeiras», a entrega dos seus excedentes, no todo ou em parte. Para o efeito era preciso fazer alguma forma de expansão territorial, normalmente acompanhada de expansão demográfica.
Mas isso da expansão geográfica e demográfica é aqui e para já (para esta explanação), pouco relevante. 
O que importa aqui considerar é que a partir de determinada altura alguns dos grupos de «agentes económicos» que se iam apropriando dos excedentes produzidos no seio de cada sociedade como um todo, autonomizaram-se (nesse processo de apropriação) relativamente aos «chefes», «reis» ou «imperadores» que até aí tinham sido os «agentes» preponderantes nas decisões de produção de excedentes e sua apropriação (colectiva ou pessoal). Estou aqui a pensar em canais de irrigação assim como em fábricas (manufacturas reais) e criação conjunta de companhias magestáticas por parte de alguns «soberanos» e grupos de mercadores.
Essa autonomização veio a dar origem a um predomínio – hoje absoluto – de um determinado conjunto de regras que determinam o modo como se joga a interacção entre, por um lado, a sociedade humana com a Natureza e, por outro lado, entre dois grandes tipos de «agentes económicos».
Relativamente à interacção entre a Humanidade e a Natureza pouco há a dizer aqui, a não ser chamar a atenção para o facto de que o crescimento ilimitado (porque também é disso que se trata) num planeta com claros e bem determinados limites físicos é simplesmente impossível a partir de uma determinada fase do processo de acumulação.
Se estamos perto ou ainda longe de alcançar esses limites é algo que aqui não interessa para efeitos desta explanação. Apenas se presume aqui que o processo de acumulação continua através da apropriação e transformação de parcelas da Natureza, por parte dos diversos grupos sociais.
Por outras palavras, é ao mais profundo nível de abstracção, e tendo em linha de conta apenas a produção e distribuição de «coisas com valor» que se deve proceder a esta análise. A questão da expressão monetária desses valores (ou seja, o «dinheiro»...) não entra aqui nestas considerações.
São questões importantíssimas mas devem ser discutidas a outro nível de análise.
(para continuar...) 
 

A PROPÓSITO DE ALGUNS COMENTÁRIOS - 2

(continuação...)
Ao longo dos milénios, desde tempos imemoriais, todos os grupos humanos sempre tiveram a possibilidade – ou a capacidade – para produzir mais do que o necessário para a sua própria reprodução como espécie biológica.
Podemos mesmo dizer que a humanidade é a única espécie biológica que tem essa capacidade. Todas as outras espécies limitam-se a reproduzir-se enquanto tal. De certa forma, todas trabalham. Mas só a humanidade realiza «trabalho excedente».
No caso das muitas espécies animais todas elas fazem «trabalho» no sentido de que aplicam a sua força ou energia na transformação (ou deslocação) de matéria. No caso dos herbívoros, na busa de vegetais apropriados à sua alimentação. No caso de carnívoros, na caça de herbívoros. Em todos os casos na procura e/ou construção «pré-programada» de ninhos, covis ou outros refúgios.
No caso da esécie humana, no entanto essa aplicação de trabalho (ou energia) na transformação (ou deslocação) de matéria segue-se a uma resolução e acaba sempre por ter objectivos ou finalidades que ultrapassam a mera reprodução.
Ao longo dos milénios alguns grupos humanos, no entanto, têm-se limitado a «gosar a vida», trabalhando apenas o suficiente para se reproduzirem enquanto grupo social, dedicando o resto do tempo actividades conscientemente culturais de recreio e lazer. Mas a grande maioria dos grupos cedo começou a acumular. Desde a China e Japão, até às Américas, passando pela Índia, Indonésia, «Médio Oriente, Egipto, Etiópia e resto de África, são hoje ainda conhecidas enormes obras de engenharia civil que testemunham essa capacidade de produção de excedentes. Estou não só a referir-me a coisas como pirâmides e palácios e templos, mas também a sistemas de irrigação e de arroteamento e demarcação de terras. O resultado natural dessas manifestações do trabalho excedente de muitas gerações, designa-se então por «acumulação».
Os conceitos aqui a reter, para já, são as noções de «trabalho necessário» (à reprodução de cada grupo social), «trabalho excedente» (para além da mera reprodução) e «acumulação».
 (continua)

A PROPÓSITO DE ALGUNS COMENTÁRIOS – 1

Em primeiro lugar é preciso salientar que esta temática da «queda tendencial da taxa de lucro» está para o estudo do sistema capitalista como o estudo da «força da gravidade» está para a Física. Tal como na Física há uma série de minudências que fazem a radical diferença entre a teoria de Newton e a teoria de Einstein, também aqui as minudências são mais do que muitas.
Tanto quanto eu saiba, a «coisa» começa por ser assinalada por Adam Smith (se calhar ainda antes disso...). De facto aquele autor de fins do século XVIII já se referia a essa tendência para uma queda da taxa de lucro em determinadas fases da evolução do sistema capitalista. Ou seja, a «coisas» começa por uma observação empírica.
Só depois é que vêm as tentativas de explicação teórica.
É também preciso salientar que esta temática tem sido objecto de centenas de artigos, ensaios, «papers», comunicações a congresssos, teses de doutoramento e, claro, muitos livros.
Alguns observadores do blogue fizeram-me chegar por «email» dúvidas e pedidos de esclarecimento relativamente ao gráfico sobre a oscilação recorrente da taxa de lucro e evolução aos solavancos do nível (volume) geral do emprego. De facto, a «coisa» apresentada assim «a seco» é capaz de causar muitas confusões, dúvidas e perplexidades do tipo «de que é que este senhor está a falar?»....
Tudo isto tem que ser visto considerando a Humanidade e seus recursos na sua totalidade: 7.000 milhões de pessoas ocupando um planeta e fazendo o aproveitamento dos recursos naturais do planeta e da sua capacidade de trabalhar, segundo determinadas regras.
(continua...) 

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Ainda - e mais uma vez - o Comportamento da Taxa de Lucro

Tenho dito, escrito e repetido que a taxa de lucro está para o sistema capitalista como a força de gravidade está para o planeta Terra, ou que como as cenouras para os coelhos ou o agitar do pano vermelho para os touros... 
Isto parece mania, mas não é... 
Também costumo citar Kurt Lewin (famoso sociólogo norte-americano de origem germânica e refugiado aos nazis) quando ele dizia que «não há nada mais prático do que uma boa teoria».
Por outro lado, todo e qualquer empresário pode confirmar que só se justifica fazer investimentos – e não aqui estou a falar de «aplicações financeiras» (mania que alguns comentadores e jornalistas têm de chamar «investidores» a pessoal que gere essas aplicações financeiras»...) - se as perspectivas de lucro forem suficientemente atractivas.
Assim sendo pareceria razoável que os dirigentes de um qualquer país prestassem atenção aos sinais que venham das «profundidades» (mais ou menos invisíveis) da economia real. Designadamente o comportamento da taxa de lucro.
Ao longo dos últimos 34 anos tenho dedicado parte do meu tempo a estudar esta temática – o que me levou por uma enormidade de leituras dos mais diversos autores e a algumas interessantes discussões sobre a viabilidade (ou não) de demonstrar uma alegada queda tendencial da taxa de lucro e de comprovar (ou não) a sua razoabilidade e aplicabilidade aos dados históricos empiricamente verificados.
Entretanto - e para que conste - o trabalho cujos resultados apresento mais abaixo não teria sido possível sem a preciosa (ou inestimável) colaboração de um colega do programa doutoral em ciências da complexidade do ISCTE e da FCUL.
Por outro lado, há umas semanas atrás solicitei a um grupo de leitores com quem esta questão tem sido discutida, alguma opinião crítica sobre a legibilidade do gráfico que aqui se apresenta.
Passo a esclarecer:
Se a taxa de lucro funciona simultâneamente como «motor» e «indicador» da dinâmica de investimento, já o nível geral de emprego funciona, quer como indicador da «saúde» do sistema económico, quer como indicador da expansão e retracção, ou seja, da dimensão do sistema como um todo.

A respeito da queda tendencial da taxa de lucro, escrevia Keynes o seguinte:
«Mas pior ainda. Não só a propensão marginal para o consumo é mais fraca numa comunidade rica, mas, devido ao facto de que a sua acumulação de capital ser já maior, as oportunidades de mais investimento são menos atraentes a menos que a taxa de juro desça a um ritmo suficientemente rápido»
Qualquer observador das coisas das finanças sabe que as taxas de juro dos bancos centrais estão perto do zero (ou mesmo negativas, se levarmos a inflação em linha de conta). Ou seja, há muito tempo que a taxa de lucro deixou de funcionar como incentivo ao investimento real.

O gráfico apresentado mais abaixo, apresenta o comportamento do sistema nas duas variáveis aqui consideradas: a taxa de lucro e o nível de emprego.
Considerei aqui uma taxa anual de refluxo (aquilo que reflui para o sistema sob a forma de investimento real) de 1,5% com impacto sobre a produtividade agregada de 2,8% e uma taxa de destruição periódica de 25% do «valor acumulado» (capital fixo e capital constante)1,
A simulação aqui reproduzida contempla 210 anos (foi em 1803 que foi inaugurada a primeira linha de caminhos de ferro e apresentado o primeiro barco a vapor...) de evolução teórica (nos circuitos electrónicos de um qualquer computador...).

Como não disponho dos meios necessários e suficientes para isso, tenho mesmo que deixar ao cuidado de eventuais historiadores e economistas menos ortodoxos, a eventual tarefa de documentar e comprovar (ou não) a aplicabilidade disto tudo à história económica dos últimos séculos. 
Era capaz de dar um bom terreno para teses de doutoramento...
Na espécie de simulação que qualquer pessoa se pode entreter a experimentar qualifico a destruição periódica de valor acumulado como «Factor Potlatch».
A razão é simples: «potlatch» era um cerimonial dos povos do Noroeste da América do Norte em que eram destruídos e/ou consumidos excedentes económicos em ritos de grande ostentação – uma especie de desafio a ver quem era «mais rico». Tais cerimónias foram proíbidas pelos governos dos Estados Unidos e do Canadá já em princípios do século XX.
 Moral da história: Se «isto» corresponder à realidade dos factos - ou seja, se a tese da queda tendencial da taxa de lucro estiver correcta ou se for possível comprová-la por observação empírica ou pelos registos históricos - então bem podem clamar por «mais empreendedorismo», por «mais financiamento à economia» e por muitos e variados «incentivos» que o «bicho» mexe»...
Quando muito vai-se arrastando.
Uma outra conclusão - e já muita gente diz isso - se o gráfico acima representar minimamente a realidade económica, então os cerca de 10 milhões de empregos perdidos nos últimos cinco anos  só na Europa  (diz a OIT...) só voltam a ser recuperados daqui a mais uns vinte anos...

Clique aqui para ir ao sítio da experimentação.
 
1Estou aqui consciente da sobreposição destas duas categorias analíticas...