terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Ainda a propósito da Jerónimo Martins

No último programa «O Eixo do Mal» a Jerónimo Martins voltou a ser o «bombo da festa».
Com excepção de Daniel Oliveira aquilo foi uma espécie de desafio da asneira, em alguns casos pura demagogia ou simples ignorância/desconhecimento sobre as coisas da globalização. É verdade que ninguém é obrigado a estudar a fundo estes fenómenos, mas o estudo destas matérias não sendo «campo reservado» de especialistas (a matéria interessa a toda a gente...) deveria ser, pelo menos, uma preocupação de quem tem «tempo de antena» e vai para a TV botar palpites e ajudar a «fazer a opinião».
Repito, tirando os comentários de Daniel Oliveira e a sua pertinente e repetida pergunta «se não há interesse financeiro/fiscal em a JM ir para a Holanda, então porque é que vai?», quase todo o discurso dos participantes foi para comentar/condenar ou explicar a decisão tomada com base na moralidade (ou falta dela) dos dirigentes da JM. Como se a Ética tivesse alguma coisa a ver com isto ou se os dirigentes empresariais fossem atrás de injunções morais... Como se não houvesse uma lógica objectiva e implacável do sistema.
Depois e para ajudar à festa veio a notícia de que a Jerónimo Martins andava a distribuir uns panfletos a explicar aos clientes da cadeia «Pingo Doce» as «inverdades» (porque será que não dizem «mentiras»?...)
Vamos a ver: a Holanda (o estado holandês e os bancos ali existentes) não trabalha de borla («não há almoços grátis» dizem eles, com alguma razão).
Se não estou em erro, foi em 2008 que transitaram pela Holanda – a caminho de outros refúgios fiscais – qualquer coisa como 18.000.000.000.000 de dólares. Imagine-se que os bancos holandeses só cobravam 0,5% (meio por cento) de comisssão pelo serviço prestado. Teriam sido 90.000.000.000 de dólares que por ali ficaram. Dados os reduzidos «custos de transacção» relativos àquele trânsito, imagine-se que metade daqueles biliões (sei lá...) foram direitinhos para as contas de lucros dos tais bancos. Depois imagine-se também que os bancos holandeses pagaram ao Estado Holandês apenas 10% de imposto sobre aqueles «lucros». O estado holandês teria assim empochado (se calhar não... isto sou eu só a especular...) qualquer coisa como 4.500.000 de dólares. Não seria assim de admirar que eles, os holandeses, não tenham grandes problemas de «dívida»... E que o Estado Social deles esteja muito melhor do que o nosso...
Veio também à baila a estória da não existência de um acordo de dupla tributação entre Portugal e a Colômbia. Como a Holanda tem acordos desses com quase todos os países (como seria de esperar de qualquer refúgio fiscal que se preze...), essa seria uma das razões pela qual a família Soares dos Santos teria tomado aquela decisão. A razão de ser de «acordos de dupla tributação» é justamente a evitação de pagamento de impostos, duas vezes, supostamente sobre os mesmos rendimentos (haverá logo aqui uma confusão conceptual entre rendimentos pessoais e lucros empresariais, mas adiante...). Seja como for, e sem fazer aqui qualquer processo de intenção a quem quer que seja, convém lembrar que uma das razões para o aproveitamento daqueles acordos de «dupla tributação» é a «dupla não-tributação». O leitor visitante que passe por aqui experimente ir ao Google (ou outro mecanismo de busca...) e introduza como frase de busca «Double Non Taxation» e encontra logo milhares de ocorrências. Salienta-se em particular o texto «European Commission to launch a public consultation on double non- taxation - December 2011».
Como assinala o Prof. Sol Picciotto da Universidade de Lancaster, há muitas décadas que as grandes empresas e as grandes fortunas pessoais descobriram como transformar a evitação do pagamento de impostos em duplicado – não pagar a dois Estados – em não pagar impostos nenhuns...

1 comentário:

  1. Ora aqui está!
    Estou sempre a lembrar-me do texto de Marx sobre a Moral da economia política.
    Não ouvi o eixo do mal e pouco ouvi sobre o meu vizinho Soares dos Santos (também tenho de me poupar...), mas acho que "descobri" uma coisa que vou colocar no meu anónimo a propósito de uma afirmação lamentosa que ele fez.

    As melhores saudações

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